quarta-feira, 8 de maio de 2013

A única alternativa para o desemprego não se alastrar na Serra do Mel RN. O CORTE DE CASTANHA.

Cajucultura

Cajucultura
Setor clama por incentivo e tecnologia
A boa performance das exportações de castanha de caju é fundamental para assegurar a sobrevivência do setor primário que não se sustentaria sem a indústria

Por ÂNGELA CAVALCANTE

Com mais de 400 000 dos cerca de 700 000 hectares plantados de caju no Brasil, uma participação estimada em 85% da capacidade instalada de 450 000 toneladas na indústria de castanha nacional e tendo a amêndoa como o principal item da pauta de exportação do estado, o Ceará enfrenta o risco iminente de estagnação da cajucultura. Ano após ano, há perda sistemática de produtividade, que culminou com a quebra de mais de 60% da safra em 2010, fenômeno impulsionado sobretudo por fatores climáticos. Sem matéria-prima suficiente para alimentar as empresas de beneficiamento da castanha in natura, a perspectiva é de paralisação em massa do parque industrial já em maio, com a suspensão temporária dos contratos de 10 000 trabalhadores.

Quem alerta é o presidente do Sindicato das Indústrias de Beneficiamento de Castanha de Caju e Amêndoas Vegetais do Estado do Ceará (Sindicaju), Lúcio Carneiro. Segundo ele, os maiores entraves enfrentados no momento pela cajucultura no estado, considerando o cenário macroeconômico, são o câmbio, o sistema de tributação e a política salarial vigente. “Esses componentes apontam para a situação triste na qual se encontram as indústrias beneficiadoras. Temos um custo alto na área do processamento da matéria-prima e uma conjuntura contrária ao segmento. Necessitamos de desoneração fiscal e das reformas previdenciária e trabalhista, que não saem”, ressalta Lúcio Carneiro.

No contexto da economia local, o empresário diz que o setor enfrenta outros graves problemas, como carência de investimento em inovação tecnológica, falta de verba e realização de diagnósticos paliativos. “A área onde é viável a substituição de copas dos cajueiros não ultrapassa 30% do total de hectares plantados. Isso não resolve o problema dos nossos pomares. Mas, mesmo assim, a promessa de verba para esse projeto é tão tímida que levaríamos cem anos para substituir todas as copas”, ressalta Lúcio Carneiro, que enxerga a redenção da cajucultura a partir da implantação de novas tecnologias, a exemplo do plantio de mudas de cajueiro anão precoce. “Mas será que haverá verba para isso? Existem efetivamente interessados em investir na cultura do caju, diante de tantos pontos contrários?”, questiona.

O presidente do Sindicaju afirma que para o setor industrial, a curto prazo, só existem duas alternativas: ou o governo federal permite a importação de matéria-prima em pequeno espaço de tempo, gerando uma oferta permanente e em grande quantidade para suprir a capacidade do parque, ou efetiva a Zona de Processamento de Exportação (ZPE), reservando nela uma área para plantas de empresas beneficiadoras de castanha de caju que quiserem se transferir para o local. Tais iniciativas devem estar associadas ao apoio aos produtores para implementar novas tecnologias. A médio prazo, Lúcio Carneiro defende o reforço do plantio nacional, com ajuda aos microprodutores.


Solução emergencial
Visando evitar o desemprego de aproximadamente 10 000 trabalhadores que atuam no processamento da castanha no Ceará e a manutenção da cadeia produtiva do caju, que engloba no estado mais de 150 000 pessoas, o segmento busca uma solução emergencial oriunda dos governos, como a criação de um crédito prêmio de exportação ou um mecanismo semelhante, como o crédito presumido federal ou estadual. Lúcio Carneiro sugere que o crédito ou o prêmio utilize recursos provenientes de renúncia fiscal ou de um fundo soberano. “Só vejo esses dois caminhos para vitaminarmos as nossas exportações”, frisa.

Ele defende também a adoção de política de desoneração para o setor com o aproveitamento de créditos que há tempos não são devolvidos. “Poderíamos pagar a Previdência Social com créditos do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Essa seria outra forma emergencial de desonerar as empresas e dar competitividade”, propõe o empresário, para quem a boa performance das exportações de amêndoas é fundamental a fim de assegurar a sobrevivência do setor primário, o qual não se sustentaria sem a indústria. O industrial afirma que não imagina a economia do Ceará sem a cajucultura. “Não existe nada mais cearense do que o caju”, sublinha Lúcio Carneiro.

Produtores desestimulados
Sem o incentivo dos governos, os produtores se sentem desestimulados e o cultivo do caju tende a desaparecer, apesar de sua incontestável importância à economia cearense e nordestina. “O caju atualmente é a única cultura da entressafra no nosso estado e está se acabando. Será mais uma cultura a desaparecer...”, lamenta o presidente do Sindicato dos Produtores de Caju (Sincaju), Paulo de Tarso Meyer Ferreira. Ele reconhece que fatores climáticos como a escassez de chuvas, altas temperaturas e ventos fortes agravaram o problema da cajucultura no ano passado, mas lembra que muitas outras ações simples podem ser empreendidas para tornar a cultura do caju mais produtiva. “Nunca vi qualquer cultura ser produtiva sem nutrientes no solo. É preciso no mínimo limpar, podar, adubar, cortar os galhos para combater os fungos. Mas com o dólar baixo, o custo alto da energia e o peso dos tributos, o produtor acaba se desestimulando”, diz Paulo de Tarso.

Segundo ele, a cajucultura no Brasil sempre esteve à margem do uso de tecnologias, sendo esse o principal motivo da redução em sua produtividade. “No estado do Ceará, chegamos a sair de 700 quilos/hectare, no início da década de 1970, para em torno de 250 quilos/hectare atualmente”, pondera. O titular do Sincaju defende que a solução para a cajucultura é o governo incentivar a substituição da copa dos cajueiros improdutivos pelo anão precoce – uma variedade de cajueiro de menor porte, com maior resistência e produtividade. “Existem 330 000 hectares de cajueiro em total extrativismo. É necessário ampliar o programa de substituição de copas. E o governo precisa ajudar o pequeno e o médio produtor também”, defende Paulo de Tarso.

João Baptista Ponte, presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva da Cajucultura e da Associação dos Cajucultores do Estado do Ceará (Ascaju), reforça a urgência de apoio institucional para ampliar a rentabilidade do cultivo de caju por hectare no país. “De acordo com os registros da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará (Ematerce), a média de produção das plantações de caju no Brasil é de 347 quilos/hectare. Na Índia, a média estimada é de 691. No Vietnã, 1 978 e, na Nigéria, 2 706. “Se tivéssemos o mesmo nível de produtividade, com 300 000 hectares de cajueiros, teríamos uma produção de aproximada de 800 000 toneladas”, calcula João Baptista.

Em 2010, porém, as chuvas escassas e irregulares, além dos fortes ventos, ocasionaram o retardamento na fase de floração, reduzindo significativamente o processo de floração/frutificação, que resultou na quebra histórica da safra, culminando numa safra 2010/2011 em torno de 50 000 toneladas, com perda de aproximadamente 62% em relação à safra 2009/2010 (135 000 toneladas). De acordo com João Baptista, o Garantia Safra – uma ferramenta colocada à disposição pelo governo para compensar as perdas dos produtores – tem valor insignificante. “Para o pequeno produtor, R$ 600 pode ajudar, mas para o médio produtor não representa nada”, reclama, lembrando que essa não é a única limitação das ações governamentais: “Elas não estimulam o crescimento da cajucultura no país. Projetos de plantação de novos pomares e de mudança de copa têm como padrão a agricultura familiar”.

No âmbito estadual, João Baptista reconhece que o governo tem incentivado a substituição das copas, trocando as plantas de grande porte pelos cajueiros anões precoces, mas observa que o alcance do programa ainda é limitado. Pelo incentivo oficial, pequenos produtores podem adquirir as mudas do anão precoce e pagar com a produção após quatro anos. “Mas é para a agricultura familiar. O médio e o grande não têm esse incentivo”, denuncia. É por isso, afirma, que as florestas de cajueiro anão precoce só representam 10% da cobertura total no estado”, justifica o titular da câmara setorial do caju e da Ascaju, que propõe a criação de uma secretaria estadual do agronegócio para cuidar exclusivamente da área. “Essa secretaria seria um instrumento para atender às demandas de todos. Não só dos pequenos produtores, mas também dos médios e grandes”, completa. Conforme João Baptista, no Ceará existem 57 700 produtores rurais, ocupando uma área de 334 617 hectares.

FIEC aponta soluções

O consultor Francisco Mavignier Cavalcante França, que está desenvolvendo um estudo sobre a cajucultura para o Instituto de Desenvolvimento Industrial (INDI), órgão da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC), aponta dez bandeiras para impulsionar a competitividade da cajucultura cearense, que englobam desde o investimento em pesquisa e inovação até a expansão da participação do estado nos mercados interno e externo.

Francisco Mavignier explica que o primeiro passo é fomentar ações de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I). Em segundo lugar, sugere a utilização de tecnologias inovadoras viáveis. As bandeiras seguintes são apoiar negócios inovadores, fortalecer os Arranjos Produtivos Locais (APLs) de caju, priorizar os produtos e coprodutos consolidados e emergentes, fomentar a capacitação dos agentes produtivos, apoiar o empreendedorismo emergente, adotar novas estratégias empresariais, maximizar a utilização das políticas governamentais e expandir a participação no mercado interno e externo.

O consultor sugere como ações imediatas, para atender às demandas mais urgentes dos agentes produtivos da cajucultura cearense, a elaboração e execução de um programa de promoção e marketing do caju por meio de feiras, material de divulgação, trade shows, propaganda institucional, turismo, seminários etc. Outra iniciativa emergente sugerida é a criação de um portal do caju na internet, um jornal de periodicidade mensal.

Francisco Mavignier lembra que o cultivo do caju é uma das raras atividades agrícolas do Ceará, ainda competitiva e de importância econômica e social. Segundo ele, falta o produtor se motivar e investir na cultura de forma profissional. Ele arremata: o mercado é crescente e há potencial para se produzir 800 quilos de castanha por hectare, aproveitando o pedúnculo em sucos, doces e cajuína.

Perfil do setor
O agronegócio do caju tem a sua fonte geradora no cajueiro, árvore típica do Nordeste, cultivada em cerca de 700 000 hectares distribuídos nos estados do Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Maranhão e Bahia, proporcionando uma safra anual de castanha em torno de 320 000 toneladas.

A castanha de caju in natura é a matéria-prima utilizada pela indústria de processamento, que dela obtém a amêndoa de castanha de caju (ACC), e extrai o líquido da casca da castanha (LCC), produtos destinados à exportação.

Atualmente o Brasil ocupa o terceiro lugar na produção mundial de castanha de caju in natura, e também na oferta de amêndoas de castanha de caju, sendo amplamente reconhecido pela boa qualidade de suas amêndoas e, principalmente, pela confiabilidade de seus fornecedores.
Na região Nordeste a cadeia produtiva do caju é responsável por mais de 300 000 empregos, distribuídos na atividade agrícola, industrial e serviços. O parque industrial é composto por 12 unidades processadoras, com capacidade de processar até 420 000 toneladas de ACC e 45 000 toneladas de LCC.

Dados do Centro Internacional de Negócios (CIN) da FIEC revelam que no ano passado as vendas externas cearenses de castanha de caju somaram US$ 182,01 milhões. Apesar da retração de 2,7% em relação às divisas obtidas em 2009 (US$ 187,02 milhões) e da queda no volume exportado no mesmo período (de 38,49 milhões de quilos, em 2009, para 33,41 milhões de quilos, em 2010), o produto figurou na liderança da pauta de exportação do estado, com participação de 14,3% no total das vendas externas, que somaram US$ 1,26 bilhão.

No contexto dos setores exportadores, as vendas de amêndoa e do líquido da castanha de caju totalizaram US$ 191,07 milhões em 2010, colocando o segmento na vice-liderança das exportações cearenses, atrás apenas do setor de calçados, englobando produtos de couro, plástico e borracha. A comercialização externa de todos os esses tipos de calçados renderam ao estado no ano passado a soma de US$ 403,46 milhões.
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